Como é sabido, as proteínas são compostas por grandes cadeias de aminoácidos, sendo que dos 20 aminoácidos existentes, alguns deles temos de obter a partir da alimentação. Dois desses aminoácidos, a metionina (MET) e a cisteína (CIS), são chamados de aminoácidos sulfurados por conterem enxofre. Para cada um desses aminoácidos temos necessidades diferentes e embora se pense que a maioria dos aminoácidos sejam seguros quando ingeridos nos níveis normais, existem algumas evidências que sugerem que uma ingestão elevada de MET e CIS esteja associada a riscos para a saúde .

Em modelo animal, níveis elevados de aminoácidos sulfurados estão associados a inibição do crescimento e um risco elevado de doenças cardiometabólicas, incluindo doenças cardiovasculares e diabetes tipo 2. Estes e outros estudos sugerem que a MET e a CIS possam ser considerados como dos aminoácidos mais tóxicos, com potenciais riscos para várias doenças crónicas . Por outro lado, vários estudos em modelo animal têm mostrado que dietas com restrição de aminoácidos sulfurados (SAAR) poderão ser benéficas a atrasar o processo de envelhecimento e a inibir o desenvolvimento de doenças relacionadas com o envelhecimento .

A restrição de metionina tem sido estudada em estudos pré-clínicos pelos seus efeitos no aumento da longevidade e melhoria da saúde metabólica, incluindo diminuição de peso e adiposidade, diminuição da resistência à insulina e melhorias nos marcadores da insulina, glicose, leptina e adiponectina . Uma revisão sobre os efeitos da restrição de aminoácidos sulfurados (metionina e cisteína) em animais mostrou que esta esteve associada a um aumento da longevidade (restrição de 80% aumentou 44% a longevidade), diminuição do risco de doenças crónicas, melhorias metabólicas (peso, IGF-1, glicémia, insulina, etc.) e diminuição do stress oxidativo .

Um estudo que incluiu 11576 participantes sugere que dietas com níveis elevados de metionina e cisteína possam aumentar o risco de doenças cardiometabólicas. De acordo com os resultados, aqueles que fizeram uma ingestão superior de MET e CIS tiveram um aumento dos níveis de fatores de risco de doenças cardiometabólicas, tais como colesterol, triglicéridos, proteína C-reativa, ácido úrico, glicose, insulina e hemoglobina glicada. O estudo mostrou também que na população estudada dos EUA, a ingestão de MET e CIS é cerca de 2,5 vezes superior da necessidade média necessária, dando-nos conta também que dietas pobres em aminoácidos sulfurados têm maior quantidade de proteína de origem vegetal do que animal. Por outras palavras, dietas de base vegetal são naturalmente baixas em MET e CIS .

Sendo um dos nutrientes essenciais, a ingestão de referência populacional (PRI) de MET e CIS são de 12,2 mg/kg/dia no caso da metionina e 6,6 mg/kg/dia no caso da cisteína. O aminoácido metionina encontra-se naturalmente presente em grandes concentrações em alimentos de origem animal como: peixe, galinha, porco, queijo, peru, carne vermelha, ovos, entre outros. Por outro lado, uma dieta de base vegetal, especialmente no caso das veganas, é naturalmente baixa em metionina .

Também relativamente ao cancro, a restrição de metionina poderá ser eficaz a inibir o seu desenvolvimento. A metionina é um aminoácido sulfurado essencial que participa na síntese de proteínas, metilação do ADN e síntese de poliaminas. É o primeiro aminoácido na cadeia de qualquer proteína. A metionina pode também ser obtido endogenamente a partir da regeneração da homocisteína, na qual participam também a vitamina B12 e o folato. No entanto, as células de cancro não têm a enzima responsável por produzir metionina a partir de homocisteína, o que as torna dependentes de fontes externas (alimentação) do aminoácido para a sua sobrevivência e proliferação .

Por esse motivo, a restrição de metionina poderá ser uma forma de explorar essa vulnerabilidade das células de cancro e inibir o seu crescimento, além de poder também interagir com tratamentos que afetam a mesma via metabólica, tal como a quimioterapia, e melhorar os seus resultados. Vários estudos in vitro e in vivo sugerem que a restrição de metionina é capaz de destruir seletivamente as células de cancro, inibir o seu crescimento e aumentar a esperança de vida saudável . Em modelo animal, a restrição de metionina sozinha ou em combinação com algumas quimioterapias tem mostrado efeitos promissores no tratamento de cancros como sarcoma, cólon e próstata, além de poder inibir a metastização de células de cancro .

Um estudo reforça a tese de que a restrição de metionina poderá ser eficaz no tratamento de alguns cancros, tendo mostrado que a mesma foi eficaz a inibir o crescimento de tumores em modelo animal e humano. Numa primeira fase do estudo, os investigadores mostraram que uma dieta com restrição de metionina foi capaz de levar a alterações metabólicas em ratos nas vias dependentes de metionina. De seguida aplicaram uma dieta com restrição de metionina em animais com cancro colorretal e animais com sarcoma. No primeiro caso (cancro colorretal) os investigadores utilizaram uma dose de quimioterapia baixa que só por si não teve efeitos no desenvolvimento do cancro. Quando combinaram esse tratamento com restrição de metionina houve uma inibição muito significativa do crescimento tumoral. No caso do sarcoma, foram observados os mesmos efeitos quanto combinada com radioterapia.

Por último, como prova de conceito, os investigadores aplicaram uma dieta com restrição de cerca de 83% de metionina em 6 voluntários humanos saudáveis ao longo de 3 semanas. Ao fim desse tempo foram observadas alterações metabólicas em vias dependentes de metionina semelhantes às observadas em animais, o que sugere que se obtenham os mesmos resultados no tratamento de cancro. Este estudo clínico piloto mostrou também que é possível fazer uma dieta com restrição de metionina sem risco de toxicidade, sendo que os níveis de metionina utilizados no estudo podem ser obtidos em dietas veganas ou algumas versões mediterrânicas .

Este estudo é de natureza preliminar, pelo que terão de ser realizados mais estudos que confirmem estes resultados. Além disso, não é possível extrapolar os mesmos para outros tipos de cancro, uma vez que estes poderão ter mecanismos diferentes e serem vulneráveis a outras intervenções nutricionais como restrição de glicose ou outras. No entanto, são resultados promissores que apontam no sentido de uma maior importância que terá a dieta no tratamento de alguns cancros.

Uma dieta de base vegetal, especialmente no caso das veganas, é naturalmente baixa em metionina. Nesse sentido, dietas veganas poderão ser uma forma eficaz de controlar o crescimento de alguns cancros .

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