A massa muscular é regulada pelo equilíbrio entre a taxa de síntese proteica muscular (MPS) e quebra de proteína muscular (MPB) (Phillips, 2004). Tanto os exercícios de força como a ingestão de proteína podem de forma independente ou combinada estimular a MPS, o que leva à hipertrofia muscular (Moore, 2019). Além disso, a resposta de MPS depende da disponibilidade de aminoácidos essenciais, em especial de leucina, o qual existe em diferentes quantidades dependendo da fonte de proteína utilizada (Volpi et al., 2003). Nesse sentido, uma vez que as proteínas animais e vegetais têm perfis de aminoácidos diferentes, será previsível que tenham efeitos distintos na síntese proteica muscular. De facto, alguns estudos sugerem que comparativamente com a proteína animal, a proteína vegetal possa levar a uma resposta anabólica aguda inferior (Tang et al., 2009Yang et al., 2012). No entanto, o facto de ter uma resposta inferior aguda, não significa que a longo prazo não tenha uma resposta semelhante.

Para perceber melhor os efeitos na adaptação muscular ao exercício de força em função de diferentes fontes de proteína, um estudo comparou uma dieta vegana (alimentos vegetais + proteína de soja) alta em proteína com uma dieta omnívora (alimentos mistos + proteína do soro de leite) de igual aporte proteico nos ganhos de força e massa muscular de 38 indivíduos jovens que treinam musculação (Hevia-Larraín et al., 2021). Ambas as dietas foram planeadas de forma a se obterem 1,6g/kg/dia de proteína. Ambos os grupos já faziam uma dieta vegana ou omnívora durante pelo menos 1 ano. Além disso, antes e depois das 12 semanas de duração do estudo foram medidos vários indicadores por métodos como DEXA, ultrassom, biópsia e máxima força.

No final do estudo os resultados não mostraram diferenças entre veganos e omnívoros na adaptação anabólica ao treino de força, ou seja, ambas a dietas tiveram resultados idênticos no aumento de massa muscular, desde que se garanta um aporte proteico semelhante (1,6g/kg/dia) (Hevia-Larraín et al., 2021).

Anteriormente, um estudo acompanhou 2986 participantes entre 2002 e 2005. Embora um consumo superior de proteína tenha estado associado a uma melhor saúde musculoesquelética, a fonte dessa proteína – animal ou vegetal – foi irrelevante (Mangano et al., 2017). Algumas conclusões do estudo:

  • A ingestão total de proteína nesta coorte está positivamente associada à massa muscular apendicular e à força dos quadríceps, mas não à densidade mineral óssea;
  • O tipo de proteína ingerida não está associado a diferenças na massa muscular, força muscular ou densidade mineral óssea;
  • Em adultos a fonte da proteína não influencia os desfechos musculoesqueléticos.

Em resumo: para ganhar massa e força muscular a proteína vegetal é pelo menos tão eficaz como a proteína animal. No entanto, quando olhamos o conjunto e os outros efeitos para a saúde, existe clara vantagem em optarmos por proteína vegetal, estando associada a um menor risco de doenças e mortalidade, comparativamente com a proteína animal (Song et al., 2016).

Relativamente aos suplementos proteicos utilizados por alguns atletas, um estudo de pequenas dimensões mostrou que lutadores de artes marciais mistas que utilizem suplementos de proteína de arroz tiveram os mesmos resultados comparativamente com atletas que utilizaram proteína do soro de leite. Para o estudo foram criados dois grupos com 11 atletas no total. Os dois grupos tomaram 75 g de proteína de arroz ou de soro de leite ao longo de 6 semanas. Ao fim desse tempo não foram observadas diferenças entre os dois grupos na manutenção e aumento da massa muscular no contexto de um treino de alta intensidade. Apenas no grupo da proteína de arroz foi observada uma diminuição da massa gorda. Embora não tenham existido diferenças entre ambos, a proteína vegetal poderá ter algumas vantagens extra ao ter permitido perder massa gorda sem perder massa muscular.

Outro estudo realizado pela Universidade de Exeter sugere que a micoproteína (presente em produtos da marca Quorn), estimula mais o desenvolvimento muscular após o exercício físico do que a proteína do leite. O estudo mostrou que embora entre os 20 participantes que ingeriram proteína de leite a taxa de crescimento muscular aumentou até 60%, aqueles que utilizaram micoproteína tiveram um aumento de mais do dobro desses valores. O estudo sugere por isso que a micoproteína é mais eficaz a estimular o crescimento muscular após exercício físico do que proteína animal. A micoproteína é obtida a partir do fungo Fusarium venenatum, estando presente nos produtos da marca Quorn. A micoproteína é rica em proteína e fibra e é pobre em gordura, colesterol, sódio e açúcar. Além disso poderá ajudar a manter níveis adequados de colesterol, glicose e insulina e aumentar a saciedade (Finnigan et al., 2019).

Convém também lembrar que, contrariamente ao que possamos julgar, atletas de alto rendimento poderão estar em maior risco de danos no miocárdio e aterosclerose do que pessoas sedentárias (Chugh & Weiss, 2015Schwartz et al., 2014Merghani et al., 2017). Nesse sentido, uma dieta de vegetal bem planeada, naturalmente rica em antioxidantes e fitoquímicos com propriedades anti-inflamatórias, poderá ajudar a reduzir o stress oxidativo associado à atividade física e a melhorar a função imunitária (Trapp et al., 2010). Uma revisão concluiu que atletas que fazem uma dieta de base vegetal poderão beneficiar de melhor saúde cardiovascular, performance e recuperação ao terem uma massa corporal mais magra, melhor oxigenação dos tecidos, menos stress oxidativo e menos inflamação (Barnard et al., 2019).

Alguns outros factos sobre proteína e anabolismo que convém reter:.

  • Mais do que 1,6g/kg/dia de proteína não tem maiores benefícios na síntese proteica muscular. Por outras palavras, acima dessas quantidades toda a proteína em excesso não tem nenhuma utilidade para o aumento de massa muscular (Morton et al., 2018).
  • Quanto mais idade, menos a suplementação com proteína se traduz em aumento de massa muscular (Morton et al., 2018).
  • Os maiores benefícios no aumento de massa muscular com suplementação de proteína dá-se em indivíduos que fazem treino de força (Morton et al., 2018).
  • Quantidades acima de 0,24g/kg/refeição de proteína em jovens e 0,4g/kg/refeição em idosos, não se traduz em maior síntese proteica. Por outras palavras, mais do que 20 a 30 gramas de proteína numa só refeição não contribui para aumento de massa muscular (Moore et al., 2015).
  • Embora a leucina seja um aminoácido importante para a síntese proteica muscular, tomar suplementos de leucina isolada (tais como suplementos de BCAA – aminoácidos de cadeia ramificada) não se traduz em maior aumento de massa muscular ou de força, desde que o indivíduo já tenha um aporte proteico adequado (DE Andrade et al., 2020).
  • Embora suplementos proteicos possam ser úteis para aumento de massa muscular caso o aporte proteico seja inferior a 1,6g/kg/dia de proteína, o exercício de força é um contributo muito maior para o aumento de massa muscular e de força do que esses suplementos (Morton et al., 2018).

Não existindo diferenças para a performance desportiva ou aumento de massa muscular na fonte de proteína, podemos acrescentar a esses ganhos, os benefícios para a saúde de aumentar a ingestão de proteina vegetal. Um estudo prospetivo que acompanhou 131342 participantes ao longo de 30 anos concluiu que consumir mais proteína vegetal esteve associado a uma diminuição de 10% na mortalidade total e 12% na morte por doença cardiovascular. O mesmo estudo concluiu também que substituir 3% das calorias de proteína animal por vegetal esteve associado a uma diminuição do risco de mortalidade. Essa diminuição foi de 34% quando substituiu carnes processadas, 19% no caso dos ovos e 12% no caso das carnes vermelhas (Song et al., 2016).

Mais recentemente, um estudo seguiu 70696 participantes ao longo de 18 anos, tendo concluído que uma ingestão superior de proteína vegetal esteve associada a uma diminuição do risco de mortalidade total (16%) e por doença cardiovascular (30%). Além disso, substituir proteína animal (especialmente carne vermelha e processada) por vegetal esteve associado a uma diminuição do risco de mortalidade total (34%), por cancro (39%) e por doença cardiovascular (42%). Uma ingestão superior de proteínas vegetais poderá por isso contribuir para a saúde a longo prazo e longevidade (Budhathoki et al., 2019).

Uma dieta de base vegetal parece ser perfeitamente adequada para a prática desportiva além de contribuir para saúde humana e planetária a longo prazo.

Referências:

  1. Phillips SM. Protein requirements and supplementation in strength sports. Nutrition. 2004 Aug;20(7–8):689–95.

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