A ingestão de frutos e vegetais está associada a um risco inferior de doenças cardiovasculares, cancro e mortalidade, estimando-se que cerca de 7,8 milhões de mortes prematuras em todo o mundo sejam atribuídas a um consumo abaixo de 800 g por dia (Aune et al., 2017). Parte dos benefícios destes alimentos deve-se à presença de uma classe de fitoquímicos chamados flavonoides, os quais encontram-se em abundância em alimentos vegetais e bebidas como frutos, vegetais, leguminosas, cacau e chá. Os flavonoides estão divididos em 6 subclasses de acordo com a sua composição química: flavonóis, flavanóis, flavanonas, flavonas, antocianinas e isoflavonas. Vários estudos epidemiológicos, pré-clínicos e clínicos têm mostrado benefícios para a saúde destes fitoquímicos pelas suas propriedades antioxidantes, antiangiogénicas e anti-inflamatórias. Além disso poderão ser protetores para a saúde cardiovascular ao melhorar a função endotelial (Bondonno et al., 2015Carocho & Ferreira, 2013Grosso et al., 2017Williamson et al., 2018Bondonno et al., 2020).

Um estudo prospetivo que acompanhou 53048 participantes ao longo de 23 anos, procurou identificar a relação entre o consumo de flavonoides e o risco de mortalidade por todas as causas, doença cardiovascular e cancro. Alguns resultados do estudo:

  • Os participantes que ingeriram cerca de 500 mg por dia de flavonoides tiveram o risco mais baixo (17%) de mortalidade total. Acima dessas quantidades não se observaram efeitos;
  • Para a mortalidade por doença cardiovascular o risco mais baixo (9%) observou-se com uma ingestão de 500 mg por dia de flavonoides;
  • Para a mortalidade por cancro o risco mais baixo (14%) observou-se com uma ingestão de 1000 mg por dia de flavonoides;
  • Os efeitos protetores dos flavonoides foram mais expressivos no caso daqueles que têm maior risco de doenças crónicas por fumarem ou beberem mais do que duas bebidas alcoólicas por dia.

Uma chávena de chá, uma maçã, uma laranja, 100 g de mirtilos e 100 g de brócolos seriam necessários para obtermos cerca de 500 mg de flavonoides, pelo que estas quantidades são facilmente atingíveis através da alimentação. O estudo conclui que aumentar a ingestão de alimentos ricos em flavonoides poderá ser útil na diminuição da mortalidade, especialmente entre fumadores e consumidores de álcool (Bondonno et al., 2019).

Mais recentemente, outro estudo com 1253 participantes com doença de Parkinson acompanhados ao longo de 32-34 anos sugere que a ingestão de alimentos ricos em flavonoides poderá estar associada a um risco inferior de mortalidade nessa população, tendo sido observados os seguintes resultados:

  • A ingestão superior de flavonoides como antocianinas, flavonas e flavanóis esteve associada a um risco 34%, 22% e 31% inferior de mortalidade, respetivamente;
  • Uma ingestão de 3 ou mais porções por semana de frutos silvestres esteve associada a um risco 23% inferior de mortalidade.

Houve também uma diminuição de risco de mortalidade com a ingestão de vinho tinto, no entanto, convém lembrar que a ingestão de álcool em qualquer quantidade está associada a riscos para a saúde, especialmente ao risco de alguns cancros.

O estudo concluiu que uma ingestão superior de flavonoides, especialmente antocianinas, flavonas e flavanóis, poderá diminuir o risco de mortalidade em indivíduos com Doença de Parkinson (Zhang et al., 2021). Podemos encontrar estas subclasses de flavonoides em alimentos como: frutos silvestres, chás (em particular o chá verde), cacau, uvas, salsa, tomilho, aipo, malaguetas, entre outros. Além da doença de Parkinson, uma alimentação rica em flavonoides poderá ser protetora contra Alzheimer e outras demências.

Outros estudos anteriores sugerem benefícios no consumo de flavonoides para a saúde:

  • Uma meta-análise a 22 estudos prospetivos mostrou que uma ingestão elevada de flavonoides esteve associada a uma diminuição de 26% no risco de mortalidade (Grosso et al., 2017).
  • Uma meta-análise a 12 estudos mostrou que uma ingestão elevada de flavonóis esteve associada a uma diminuição de 20% no risco de cancro do colon e uma ingestão elevada de flavonas esteve associada a uma diminuição de 18% no risco de cancro retal (Chang et al., 2018).
  • Uma meta-análise a 7 estudos mostrou que uma ingestão elevada de antocianinas esteve associada a uma diminuição de 40% no risco de cancro do esófago, uma ingestão elevada de flavonas esteve associada a uma diminuição de 22% no risco de cancro do esófago e uma ingestão elevada de flavanonas esteve associada a uma diminuição de 35% no risco de cancro do esófago (Cui et al., 2016).
  • Uma meta-análise a 32 estudos mostrou que uma ingestão elevada de flavonoides esteve associada a uma diminuição de 18% no risco de cancro do ovário (Hua et al., 2016).
  • Uma meta-análise a 14 estudos prospetivos mostrou que uma ingestão elevada de flavonoides esteve associada a uma diminuição do risco de doenças cardiovasculares (Wang et al., 2014).
  • Um estudo prospetivo com 2037 participantes acompanhados ao longo de 15 anos mostrou que uma dieta rica em flavonoides, especialmente laranjas, poderá diminuir o risco de degeneração macular. Consumir 1 ou mais laranjas por dia esteve associado a uma diminuição de 61% no risco de degeneração macular (Dighe et al., 2019).

A maioria dos flavonoides resiste bem ao calor e chega ao intestino delgado intacto, onde são absorvidos. As bactérias que colonizam o cólon são também importantes no metabolismo e absorção dos flavonoides. Em geral, estes fitoquímicos têm uma biodisponibilidade baixa devido a uma absorção limitada e eliminação rápida. Os flavonoides interferem com a absorção do ferro não-heme. Chá ou cacau não devem ser consumidos com a refeição, podendo inibir a absorção de ferro até 70%. Além disso, as proteínas do leite poderão diminuir a absorção de flavonoides do cacau ou do chá, podendo por exemplo diminuir a sua capacidade antioxidante e anular os benefícios cardiovasculares dos flavonoides presentes no chá (Gonzales et al., 2015Xiao et al., 2011Lorenz et al., 2007).

Alguns exemplos de alimentos ricos em flavonoides específicos:

  • Antocianinas: Frutos silvestres, tais como amoras, framboesas, mirtilos ou morangos; uva preta;
  • Flavanóis (flavan-3-ols): chás (em particular o chá verde), cacau, uvas, frutos vermelhos, maçãs, maçãs, frutos vermelhos, uvas pretas;
  • Flavanonas: citrinos, tais como laranja, toranja ou limão;
  • Flavonóis: cebolas amarelas, couve, brócolos, maçãs, frutos vermelhos, chás, etc.;
  • Flavonas: salsa, tomilho, aipo, malaguetas;
  • Isoflavonas: feijão de soja, alimentos à base de soja, leguminosas.

Uma dieta de base vegetal variada e colorida acompanhada de chá (longe da refeição para não inibir a absorção de ferro), é uma das melhores maneiras de aumentarmos a ingestão de flavonoides (e muitas outras coisas).

Referências:

  1. Aune D, Giovannucci E, Boffetta P, Fadnes LT, Keum N, Norat T, et al. Fruit and vegetable intake and the risk of cardiovascular disease, total cancer and all-cause mortality–a systematic review and dose-response meta-analysis of prospective studies. Int J Epidemiol [Internet]. 2017 [cited 2017 Feb 24]; Available from: https://academic.oup.com/ije/article/doi/10.1093/ije/dyw319/3039477/Fruit-and-vegetable-intake-and-the-risk-of
  2. Bondonno CP, Croft KD, Ward N, Considine MJ, Hodgson JM. Dietary flavonoids and nitrate: effects on nitric oxide and vascular function. Nutr Rev [Internet]. 2015 Apr 1 [cited 2020 May 9];73(4):216–35. Available from: https://academic.oup.com/nutritionreviews/article/73/4/216/1817794
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