As isoflavonas da soja poderão diminuir o risco de doenças cardiovasculares.

O papel dos produtos de soja e das isoflavonas na saúde cardiovascular não é ainda totalmente claro. Pelas suas propriedades potencialmente protetoras, além de ser pobre em gorduras saturadas e colesterol, a soja tem feito parte de um grupo de alimentos recomendados para a prevenção de doenças cardiovasculares, sendo que esses benefícios poderão ser também resultantes da substituição de outros alimentos como a carne vermelha por soja (Jenkins et al., 2010).

Em 1999, a FDA nos EUA aprovou uma alegação de saúde para os produtos de soja como sendo protetores contra a doença coronária (, 1999). No entanto, com base nos resultados contraditórios a partir de estudos clínicos e epidemiológicos posteriores, a FDA tem reconsiderado essa alegação. Além disso, recomendações atualizadas da American Heart Association concluíram que a evidência dos benefícios das isoflavonas para a saúde cardiovascular é mínima e que esses benefícios podem ser atribuídos a maior concentração de gorduras polinsaturadas, fibra, vitaminas e minerais além de uma menor concentração de gorduras saturadas (Sacks et al., 2006).

No entanto, têm sido atribuídos vários benefícios às isoflavonas, incluindo a diminuição de colesterol LDL, inibição de citosinas proinflamatórias, proteínas de adesão celular e agregação plaquetária, aumento na produção de óxido nítrico e melhoria na reatividade vascular (Curtis et al., 2012Zahradka et al., 2013).

Vários estudos prospetivos têm mostrado uma associação inversa entre a ingestão de isoflavonas e fatores de risco cardiovasculares, assim como incidência de doença coronária. No entanto, esses resultados têm sido heterogéneos e têm limitações metodológicas (Kokubo et al., 2007Mink et al., 2007).

Uma vez que os produtos de soja são uma fonte importante de proteína vegetal, especialmente entre aqueles que fazem uma dieta de base vegetal, é necessário investigar os efeitos de produtos de soja específicos no risco de doença coronária. Um novo estudo a partir de três coortes com um total de 210700 participantes sugere que a ingestão de isoflavonas e de tofu possa estar associada a uma diminuição do risco de doença coronária. Alguns resultados do estudo:

  • A ingestão de isoflavonas esteve associada a uma diminuição de 13% no risco de doença coronária;
  • A ingestão de tofu (>1 porção/semana) esteve associada a uma diminuição de 18% no risco de doença coronária.

O estudo concluiu que uma ingestão superior de isoflavonas e tofu poderá diminuir o risco de doença coronária, sendo que esses efeitos nas mulheres são mais significativos no caso de mulheres mais novas ou depois da menopausa sem substituição hormonal. Nesse sentido, incluir produtos de soja como tofu numa dieta saudável de base vegetal poderá ajudar na prevenção de doença coronária (Ma Le et al., n.d.).

Alguns mecanismos que poderão explicar esses efeitos protetores:

  • Por terem uma configuração química semelhante aos estrogénios, as isoflavonas ligam-se aos recetores de estrogénio (ER), tendo maior afinidade pelos recetores de estrogénio beta (ERβ) (Jiang et al., 2013). Os ERβ são altamente expressos nas artérias coronárias, sendo que a sua ativação altera a permeabilidade das membranas, concentrações de iões, expressão de óxido nítrico sintase endotelial e rápida vasodilatação dos vasos sanguíneos (Siow & Mann, 2010Siow et al., 2007Menazza & Murphy, 2016).
  • Ao estimularem a síntese de óxido nítrico endotelial e a ativação do fator nuclear eritroide 2, as isoflavonas inibem o stress oxidativo e a inflamação nas células vasculares (Mann et al., 2007Irace et al., 2013Schreihofer et al., 2010).
  • As isoflavonas poderão contribuir para baixar os níveis de colesterol ao alterarem o metabolismo hepático aumentando a capacidade de remoção de LDL e VLDL dos hepatócitos. Além disso, poderão também diminuir a oxidação de LDL (Yan et al., 2006Jeon et al., 2014Zhang et al., 2017Clerici et al., 2011).
  • As isoflavonas poderão também interagir com a microbiota e produzir substâncias bioativas que exercem efeitos benéficos para a saúde humana. Por exemplo, suplementos de isoflavonas em mulheres na menopausa levou a um aumento de Faecalibacterium prausnitziiBifidobacteria e outras bactérias no intestino que têm propriedades anti-inflamatórias (Clavel et al., 2005Sokol et al., 2008). Algumas isoflavonas são convertidas pela microbiota em metabolitos como o equol, o qual tem atividade antioxidante e propriedades anti-inflamatórias (Selma et al., 2009Hwang et al., 2003Yum et al., 2011).

Anteriormente foi realizada uma meta-análise a 43 estudos clínicos controlados que incluiu 2607 participantes com hipercolesterolemia, com os seguintes resultados:

  • Aqueles que consumiram uma média de 25g de proteína de soja, ao fim de 6 semanas tiveram uma redução de cerca de 3 a 4% nos níveis de colesterol LDL.

O estudo sugere assim que o consumo de soja poderá diminuir o risco de doenças cardiovasculares ao diminuir os níveis de LDL (Blanco Mejia et al., n.d.). Essa redução deverá ser superior quando se substituem alimentos ricos em gorduras saturadas e colesterol por soja (Jenkins et al., 2010). Por outro lado, quando se combinam produtos de soja com alimentos ricos em fibra viscosa (como aveia e sementes de psílio) e fitoesteróis, a redução de colesterol LDL poderá chegar aos 29% (Kendall & Jenkins, 2004).

Existem muitas dúvidas e mitos em torno dos efeitos da soja para a saúde. Para saber mais sobre a soja consultar este artigo.

Referências:

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