Vitamina D poderá ser eficaz no tratamento do cancro da mama triplo negativo

Dos vários tipos de cancro da mama, o triplo negativo é o mais difícil de tratar. Representando cerca de 15% dos casos de cancro da mama, este cancro é assim chamado pelo facto das suas células não apresentarem à superfície nenhum  dos três recetores habituais: estrogénios (hormona que promove o desenvolvimento das células de cancro), progesterona (outra das hormonas utilizadas pelas células de cancro para se desenvolverem) e herceptina (proteína que igualmente promove o desenvolvimento do cancro). O cancro da mama triplo negativo (CMTN) é o tipo mais agressivo de cancro da mama, crescendo rápido, espalhando-se mais cedo para outras partes do corpo, sendo mais difícil de detetar e recidivando mais frequentemente. Por esse motivo é um dos mais importantes candidatos a soluções mais eficazes do que aqueles atualmente disponíveis.

efeito protetor da vitamina D em relação ao cancro foi pela primeira vez proposto em 1980. Este estudo baseou-se na observação do facto de haver uma incidência maior de cancro do colon nas regiões de latitudes mais altas (mais longe do equador). Desde então muitos outros estudos têm sugerido haver uma relação inversa entre a exposição solar e vários tipos de cancro. Um análise recente dos estudos disponíveis mostrou haver uma relação inversa entre a exposição solar e pelo menos 15 tipos de cancro diferentes. Outro estudo sugere que pessoas que vivam em regiões com exposição solar elevada apresentam menor risco de cancro do pâncreas. De facto, segundo um estudo que avaliou os níveis de vitamina D como prognóstico do cancro do ovário, níveis baixos de vitamina D3 na altura de um diagnóstico de cancro poderão significar uma probabilidade inferior de sobrevivência a 5 anos.

Recentemente, os resultados de um estudo sugerem que a vitamina D poderá ser eficaz no tratamento do cancro da mama triplo negativo. A equipa de investigadores da Universidade de Saint Louis liderada por Susana Gonzalo poderá ter descoberto uma via molecular que contribui para este tipo de cancro, um cancro frequentemente mortal, resistente aos tratamentos que geralmente afeta mulheres mais jovens. Esta equipa descobriu igualmente que a vitamina D e alguns inibidores de protease poderão interferir nessa via, desativando-a.

Mecanismos Biológicos

Mulheres que nasçam com uma mutação no gene BRCA1 tem um risco mais elevado de vir a ter cancro da mama ou do ovário, sendo que o cancro que frequentemente se desenvolve é de tipo triplo negativo. O BRCA1 funciona como um gene supressor de tumor. A forma como este gene age na proteção das funções saudáveis da célula traduz-se por estar envolvido na reparação de quebras em fitas duplas do ADN, um tipo de dano que é especialmente perigoso para a integridade do genoma. O BRCA1 está também envolvido nos pontos de verificação do ciclo celular depois de existir dano, sendo estes mecanismos de controlo durante a proliferação das células que garantem que a informação do ADN é corretamente replicada e transferida para as células-filhas.

A perda de BRCA1 resulta em instabilidade do genoma caracterizada por quebras do ADN não reparadas e aberrações nos cromossomas. Investigadores recentemente mostraram que a perda de outro fator de reparação do ADN, o 53BP1, permite a proliferação e sobrevivência de células com deficiência de BRCA1. Além disso, níveis baixos de 53BP1 foram observados em cancros da mama triplo negativos e estão correlacionados com a resistência aos fármacos utilizados no tratamento desta doença, tais como os inibidores de PARP. Por outro lado, esta equipa de investigadores descobriu que a perda de BCA1 aumenta a expressão de uma protease conhecida como catepsina L (CTSL) a qual provoca a degradação da 53BP1, o que permite a estas células sobreviverem. Tendo este mecanismo em consideração pode-se concluir que uma forma de controlar o desenvolvimento destas células passaria por aumentar os níveis de 53BP1, o que representaria uma estratégia promissora para o tratamento do cancro da mama.

A ação da vitamina D

Em estudos anteriores, a equipa de Gonzalo mostrou que a vitamina D inibe a degradação da 53BP1 mediada pela protease CTSL em células saudáveis de forma tão eficiente como inibidores específicos utilizados para esse fim. Desta vez, descobriu que ao tratarem células malignas com deficiência de BRCA1 com vitamina D repõe os níveis elevados de 53BP1 o que resulta em menor proliferação. Além disso, os resultados deste estudo sugerem que o tratamento com vitamina D poderá recuperar a sensibilidade aos inibidores de PARP em pacientes que se tornaram resistentes. Desta forma, uma combinação de vitamina D e estes inibidores poderá representar uma nova estratégia de tratamento para cancros da mama com mau prognóstico.

Em resumo:

  • Investigadores descobriram qual a via molecular através da qual as células de cancro da mama triplo negativo conseguem proliferar e resistir aos tratamentos. Especificamente: células com deficiência em BRCA1 ativam a CTSL, o que leva a níveis baixos da proteína 53BP1, o que permite as células de cancro proliferarem.
  • A vitamina D interfere com este processo, inibindo a CTSL, aumentando assim os níveis da 53BP1. Além disso aumenta a sensibilidade destas células aos inibidores de PARP.
  • No futuro, mulheres com cancro da mama triplo negativo poderão beneficiar de um tratamento que inclua vitamina D.

O que podemos já fazer?

Enquanto não existem estudos clínicos que irão avaliar os eventuais riscos e benefícios de um tratamento que inclua vitamina D, como medida de prevenção e precaução podemos já elevar os níveis desta substância no organismo, com os inúmeros benefícios que isso representa para a prevenção do cancro e de outras doenças. O sol, quando usado de forma responsável, continua a ser a melhor fonte disponível para a produção de vitamina D.  radiação em contacto com o colesterol presente na pele produz a vitamina que na realidade se trata de uma hormona esteróide. Sendo a melhor fonte de vitamina D o sol, tudo o que diminua a transmissão de radiação UVB para a superfície da Terra ou que interfira com a penetração dessa radiação na pele afeta a síntese de vitamina D3. A melanina sendo muito eficaz a absorver radiação, quanto mais presente na pele menos eficaz também será a produção da vitamina. Por outro lado, um protetor solar com um fator de proteção 15 absorve 99% da radiação UVB, reduzindo assim em 99% a produção de vitamina D pela pele. Trinta minutos ou menos (consoante o tipo de pele, a latitude e a altura do ano) deverão ser suficientes para assegurar os níveis suficientes de vitamina D de forma a assegurar um fator preventivo. Nesta ligação podem encontrar um guia de exposição solar de forma a se obterem o máximo de benefícios. Em alguns casos pode ser necessário uma suplementação extra de vitamina D3. Para tal, um profissional de saúde adequado deve ser consultado.

Além disso, um estudo recente parece sugerir que um dos componentes das crucíferas, como os brócolos ou as couves de bruxelas, poderá vir a ser um agente de tratamento de cancro da mama triplo negativo, o que mostra a eficácia destas substâncias naturalmente presentes nestes vegetais. Trata-se do diindolilmetano (DIM), um metabolito do indol-3-carbinol, conhecido pelas suas propriedades anticancerígenas. Investigadores da Universidade A&M da Florida avaliaram a atividade de uma substância produzida a partir do DIM e verificaram a sua eficaz ação anticancerígena. O estudo sugere que estes compostos obtidos a partir do DIM poderão ser utilizados no tratamento de vários tipos de cancro, incluindo o cancro da mama triplo negativo. Além disso, está a ser investigada a sua aplicação quimiopreventiva. Segundo Mandip Sachdeva, um dos autores do estudo, “as opções de tratamento para o CMTN são limitadas. Os tratamentos atuais resultam em baixa adesão por parte do paciente e toxicidade elevada”. “Estamos confiantes que os componentes nos quais estamos a trabalhar representam um tratamento eficaz para o cancro da mama triplo negativo. Estes tratamentos são mais seguros para o paciente do que os atualmente disponíveis”, conclui Sachdeva.

Referências:

https://jcb.rupress.org/content/200/2/187

https://www.slu.edu/x71202.xml

https://www.cancer.gov/cancertopics/wyntk/breast/page5

https://ghr.nlm.nih.gov/gene/BRCA1

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/7440046

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22213311

https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0009912012004535

https://www.vitamindcouncil.org/about-vitamin-d/how-to-get-your-vitamin-d/

https://lpi.oregonstate.edu/infocenter/phytochemicals/i3c/