Vírus oncolíticos poderão ser eficazes no tratamento de vários cancros
Além das terapias com células dendríticas para o tratamento do cancro, outra abordagem que parece ser promissora passa pela utilização de vírus de replicação seletiva, também chamados de vírus oncolíticos. Estes vírus infetam as células de cancro levando-as à morte sem afetar as células saudáveis. Por essa razão têm sido estudados como possível tratamento para o cancro. Embora desde os anos 60 que se tenham feitos estudos com estes vírus, só com o desenvolvimento da genética é que se tornou possível tornar mais eficaz a sua aplicação. Um dos vírus oncolíticos mais promissores para utilização como tratamento do cancro trata-se do Vírus da Doença de Newcastle (Newcastle Disease Virus), um vírus que afeta as aves mas que é inócuo nos humanos.
De acordo com um estudo publicado recentemente no Journal of Virology, um vírus da doença de Newcastle recombinante é capaz de destruir todo o tipo de células de cancro da próstata, incluindo as que são hormono-resistentes, deixando intactas as células saudáveis. De acordo com Subbiah Elankumaran, um dos autores do estudo, um tratamento para o cancro da próstata baseado neste vírus, evitaria os efeitos colaterais tipicamente associados com o tratamento convencional dessa doença.
Embora estudos clínicos com este vírus para o tratamento de vários cancros têm-se mostrado promissores, em alguns casos o vírus não alcança o tumor em quantidade suficiente. Os autores deste estudo contornaram esse problema modificando a proteína de fusão do vírus de forma a esta só poder ser ativada através do antigénio específico da próstata (PSA). Dessa forma, uma vez que o vírus passa a interagir apenas com as células de cancro, torna-se necessária uma menor quantidade do vírus.
O investigador Elankumaran acredita que este vírus modificado tem muitas vantagens em relação a outros tratamentos de cancro. Por um lado é totalmente seletivo apenas atingindo as células de cancro da próstata. Por outro lado poderia ser um tratamento eficaz em pacientes que não respondem à terapia hormonal. Nestes casos a média de esperança de vida é de cerca de 40 meses com metástases nos ossos e 68 meses se não existirem metástases.
Anteriormente um estudo desenvolvido no Memorial Sloan-Kettering Cancer Center em Nova Iorque sugere que a utilização de vírus oncolíticos poderá ser eficaz a destruir células estaminais, podendo por isso vir a ser útil para tratar cancros resistentes aos tratamentos convencionais tal como o cancro do pâncreas. Alguns investigadores sugerem que estas células estaminais possam ser responsáveis pelas recidivas e metástases de certos cancros. De acordo com um dos autores, Joyce Wong, “o que nós observámos é que estes vírus são modificados de forma a afetarem seletivamente as células de cancro e têm uma muito reduzida toxicidade em modelo animal. Tendo como alvo as células de cancro estaminais poderá aumentar a nossa capacidade de eliminar tumores e prevenir futuras recidivas”. Embora os resultados sejam muito promissores, segundo o investigador serão necessários mais estudos para confirmar a sua eficácia.
Outra das aplicações dos vírus oncolíticos, em particular o da doença de Newcastle, passa pela aplicação complementar a tratamentos com células dendríticas. Quando utilizado em simultâneo com uma vacina de células dendríticas pode aumentar a sua eficácia de várias maneiras. Não só o vírus de Newcastle pode ter uma ação direta nas células de cancro como pode ter um efeito de estimulação imunitária que induz uma resposta tanto inata como adaptativa. A ação dos linfócitos T a partir de células dendríticas sensibilizadas com lisatos de células de cancro infetadas com NDV assim como a atividade antitumoral dos macrófagos e monócitos é aumentada. Além disso o NDV induz a produção de citoquinas e quemoquinas que influenciam a atividade de várias células do sistema imunitário.
Um estudo recente desenvolvido por investigadores alemães (Neßelhut et al., 2007, 2011) mostra que uma terapia com células dendríticas em combinação com a utilização do vírus da doença de Newcastle poderá melhorar a resposta em tratamentos com glioblastoma multiforme. Este cancro tem um prognóstico muito desfavorável. A taxa de sobrevivência média depois do diagnóstico é de cerca de 15 meses. Neste estudo, onde se combinou o vírus seguido de vacina de células dendríticas, a média de sobrevivência foi de cerca de 23 meses após o diagnóstico, o que representa um prolongamento em relação aos tratamentos convencionais com superior qualidade de vida.
De acordo com o National Cancer Institute, embora a maior parte dos estudos com NDV no tratamento do cancro tenham sido pequenos e sem grupo de controlo, existem resultados promissores suficientes para se continuar a investigar.
Referências:
https://jvi.asm.org/content/87/7/3792
https://www.eurekalert.org/pub_releases/2011-05/ddw-ove050611.php
https://meetinglibrary.asco.org/content/80262-102
https://www.cancer.gov/cancertopics/pdq/cam/NDV/patient/Page2#Section_33