Embora existam incertezas em relação a vários assuntos relacionados com dieta e cancro, temos felizmente hoje já suficiente conhecimento para podermos tomar medidas. Algumas das evidências atualmente disponíveis são mesmo conclusivas e convincentes. Um desses exemplos é a relação que sabemos de forma segura existir entre o consumo de carnes vermelhas e processadas e o risco de cancro colo-retal. Em relação a outros tipos de cancro ainda não existem provas convincentes para podermos ter uma ideia final mas ainda assim existem indicadores sugestivos de que o consumo de carnes vermelhas e processadas possam estar associado a um risco superior de vários cancros:
- Esófago
- Pulmão
- Pâncreas
- Endométrio
- Estômago
- Próstata
As razões pelas quais estes produtos possam aumentar o risco de cancro podem ser várias:
- Aminas Heterocíclicas e Hidrocarbonetos Aromáticos Policíclicos: Quando as carnes dos músculos de animais é exposta a temperaturas altas, formam-se dois tipos de compostos altamente cancerígenos chamados aminas heterocíclicas (HCA) e hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (PAH).
- IGF-1: A proteína completa e os alimentos com um índice glicémico alto contribuem para o aumento dos níveis de IGF-1. Níveis elevados desta hormona de crescimento estão associados ao risco superior de vários tipos de cancro.
- Metionina: Este aminoácido está presente em grande quantidades nos alimentos de origem animal. As células de cancro têm uma dependência absoluta deste aminoácido: na sua ausência morrem, ao contrário das células saudáveis que conseguem sobreviver sem ele.
- Colesterol: Um metabólito do colesterol (27-hidroxicolesterol) comporta-se como o estrogénio, estimulando o crescimento de cancros dependentes desta hormona, tal como o da mama.
- Ferro Heme: O ferro heme presente na carne vermelha está relacionado com a formação de compostos N-nitroso.
- Nitritos: conservante utilizado nas carnes processadas, produz nitrosaminas.
- Carnitina e Colina: presentes em grandes quantidades produtos de origem animal, são metabolizados por bactérias nos intestinos, transformados em N-óxido de trimetilamina (TMAO), a qual poderá aumentar o risco de doença cardiovascular e contribuir para um aumento dos níveis inflamatórios.
Em relação ao cancro da mama, até hoje os estudos realizados não mostraram um risco superior associado ao consumo de carnes vermelhas. No entanto, a maioria desses estudos limitou-se a avaliar a dieta durante a meia-idade e daí para a frente. Alguns estudos têm avaliado o impacto no risco de cancro da dieta em idades precoces, o que poderá ser determinante para o risco futuro.
Um novo estudo desenvolvido pela Harvard (Harvard’s Nurses’ Health Study II) procurou perceber a relação entre o consumo de carnes vermelhas em idades jovens e o risco de cancro da mama. Foram incluídas mais de 88000 mulheres na fase anterior à menopausa, seguidas ao longo de 20 anos. De acordo com os resultados, o consumo de carnes vermelhas está associado a um aumento de 22% no risco de cancro da mama. Cada porção diária adicional de carne vermelha está associado a um aumento de 13% no risco de cancro da mama.
Os autores do artigo referem que a exposição às carnes vermelhas e processadas entre a primeira menstruação e a primeira gravidez poderá ser mais importante no desenvolvimento do cancro da mama. Além disso verificaram que o risco de cancro da mama era menor em mulheres que substituíram as carnes vermelhas por leguminosas durante a juventude, sugerindo que isso se deva ao facto destes alimentos serem ricos em fibra e fitoestrogénios, ambos fatores protetores em relação a este cancro. Os autores também referem um estudo no qual se verifica que substituir uma dieta rica em gordura e proteína animal por uma dieta rica em gordura e proteína vegetal pode diminuir os níveis de estrogénio em circulação em mais de 40%.
Alguns estudos sugerem que o consumo de soja de forma regular durante a infância e adolescência poderá diminuir o risco de cancro da mama em idade adulta. Substituir as carnes vermelhas e processadas por proteínas mais saudáveis, tais como os feijões e a soja, poderá diminuir muito significativamente o risco de cancro da mama.
Idéias-chave deste artigo:
O que já se sabia sobre este assunto:
- Alimentos ricos em proteínas animais e vegetais não estão de forma consistente relacionados com o risco de cancro da mama.
- A maioria dos dados obteve-se a partir de estudos realizados sobre a dieta na meia-idade. Muitos estudos sugerem que algumas exposições a fatores de risco possam ter mais consequências para o cancro da mama durante idades mais precoces.
O que este estudo acrescenta:
- O consumo elevado de carnes vermelhas durante a juventude está associado a um risco elevado de cancro da mama.
- Substituir estes produtos por proteínas mais saudáveis durante a infância e juventude poderá ser importante na prevenção do cancro da mama.
Referências:
https://www.bmj.com/content/348/bmj.g3437
https://www.channing.harvard.edu/nhs/?page_id=70
https://ajcn.nutrition.org/content/89/6/1920.long
https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1207/s15327914nc5602_18#.U5rhYvldVNI
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