Excesso de açúcar no sangue relacionado com o cancro – novos mecanismos descobertos

Tem sido um debate por vezes amargo, mas ainda não existe um consenso final e absoluto acerca do papel dos níveis elevados de açúcar no sangue. Sabemos há muito tempo que as células de cancro consomem grandes quantidades de açúcar para permanecerem vivas e que enquanto as células saudáveis geram energia utilizando algum açúcar e muito oxigénio, as células de cancro utilizam virtualmente nenhum oxigénio e muito açúcar para produzirem energia. No entanto, ainda não estão inteiramente esclarecidos todos os mecanismos biológicos responsáveis pela relação entre a obesidade, a diabetes (caracterizados por níveis elevados de açúcar no sangue) e um risco superior de cancro. Um novo estudo vem reforçar a ideia de que níveis elevados de açúcar no sangue aumentam o risco de vários cancros.

Embora se saiba que a obesidade é uma causa de diabetes, não é tão conhecido o facto de ambas estarem relacionadas com um risco superior de cancro. A população diabética tem até duas vezes mais probabilidades de virem a ter cancro do pâncreas e colo-retal, entre outros, de acordo com os estudos epidemiológicos disponíveis. Investigadores liderados por Custodia Garcia-Jimenez da Universidade Rey Juan Carlos em Madrid, descobriram um mecanismo que que relaciona estas doenças entre si: níveis de açúcar elevados os quais aumentam a atividade de um gene implicado na progressão do cancro.

Esta equipa encontrava-se a estudar como as células no intestino respondem aos açúcares e sinalizam ao pâncreas para libertar insulina, a hormona que controla os níveis de açúcar no sangue. Os açúcares no intestino estimulam as células do intestino a libertar a hormona chamada GIP, a qual aumenta a segregação de insulina pelo pâncreas. Os investigadores mostraram que a capacidade das células do intestino para segregarem GIP é controlada por uma proteína chamada β-catenina e que a atividade desta está estritamente dependente nos níveis de açúcar.

Uma atividade elevada de β-catenina está associada ao desenvolvimento de vários cancros, aumentando a capacidade proliferativa das células de cancro. Este estudo vem demonstrar que níveis elevados de açúcar levam à acumulação nuclear de β-catenina levando assim a uma maior proliferação celular. Foram identificados as moléculas envolvidas no processo assim como a diversidade de células de cancro suscetíveis a estes mecanismos. Colin Goding, professor de Oncologia na Universidade de Oxford diz que “previamente nós não tínhamos a certeza de como níveis de açúcar elevados no sangue encontrados na diabetes e na obesidade poderiam aumentar o risco de cancro. Este estudo identifica um mecanismos molecular central através do qual esses níveis elevados podem predispor ao cancro”. A autora Custodia Garcia conclui: “ficámos surpreendidos ao realizarmos que alterações no nosso metabolismo causados pelo açúcar podem ter impacto no risco de cancro. Alterar a dieta é uma das estratégias de prevenção mais simples que pode potencialmente evitar muito sofrimento”.

Talvez não devesse representar uma grande surpresa o facto de níveis elevados de açúcar no sangue estar associado a um risco mais elevado de vários cancros, uma vez que já existem várias evidências que o confirmam. O consumo de alimentos com índice glicémico (IG) elevado (quando consumidos aumentam rapidamente os níveis de açúcar no sangue) está associado ao risco de vários cancros:

Além de aumentar os níveis de insulina, consumir alimentos com um IG alto leva igualmente à produção de uma outra hormona com propriedades proliferativas e anti-apoptóticas, o IGF-1, o qual está também associado a um maior risco de vários cancros:

  • Cancro da mama: o Centro Europeu sobre Cancro e Nutrição (EPIC) verificou que os níveis elevados de IGF-1 estavam associados a 40% de risco superior de cancro da mama em mulheres na pós-menopausa. Uma meta-análise que reuniu os dados obtidos de 17 diferentes estudos prospetivos concluiu que as mulheres com níveis superiores de IGF-1 no sangue tinham um risco 28% maior de ter cancro da mama independentemente de terem tido ou não a menopausa. No Nurses’ Health Study, os níveis elevados de IGF-1 foram associados a um risco superior de cancro da mama, duas vezes maior em mulheres na pré-menopausa.
  • Cancro da próstata: uma meta-análise a 42 estudos diferentes concluiu que os níveis elevados de IGF-1 em circulação estão associados a um risco superior de cancro da próstata. Um estudo sugere que níveis elevados de IGF-1 estão associados a um risco 5.1 vezes superior de cancro da próstata de estágio avançado, sendo de 9.5 vezes superior quando associado a níveis baixos de IGFBP-3.
  • Cancro colo-retal: estudos epidemiológicos, clínicos e de laboratório sugerem que níveis elevados de IGF-1 estão associados a um risco superior de cancro colo-retal. Uma análise a vários estudos conclui que a interação entre a insulina, o IGF-1 e as suas proteínas de ligação aumentam o risco de cancro colo-retal.

Além disso, estudos igualmente sugerem outros mecanismos que associados ao consumo de açúcar podem aumentar o risco de cancro:

Convém sempre relembrar que para conseguirmos reduzir os níveis de açúcar no sangue devemos conhecer o índice e a carga glicémica dos alimentos. Farinhas brancas e cereais refinados são fontes de hidratos de carbono simples aumentando assim muito os níveis de açúcar, pelo que devem ser evitados e substituídos pela sua forma integral.

Referências:

https://www.madrimasd.org/informacionidi/noticias/noticia.asp?id=55528

https://www.alphagalileo.org/ViewItem.aspx?ItemId=128132&CultureCode=en

https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1097276512009793

https://www.hopkinsmedicine.org/news/media/releases/understanding_cancer_energetics

https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/j.1365-2133.2004.06048.x/abstract

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22760570

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22497978

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22831983

https://www.eurekalert.org/pub_releases/2012-11/dci-shc110612.php

https://erc.endocrinology-journals.org/content/13/2/593.long

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3113287/?tool=pubmed

https://www.channing.harvard.edu/nhs/?page_id=197

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9593409

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19142965

https://jnci.oxfordjournals.org/content/94/14/1099.long

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15562834

https://link.springer.com/article/10.1007%2Fs00384-005-0776-8?LI=true

https://jnci.oxfordjournals.org/content/94/13/972.long

https://www.glycemicindex.com/[/fusion_builder_column][/fusion_builder_row][/fusion_builder_container]